terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

A FÉ DE TOMÉ (Jo 20:24-29) !!!


Não sei, mas talvez você esteja pensando se eu não errei feio no título desse texto. “A FÉ de Tomé?! Mas este não foi aquele discípulo incrédulo que duvidou da ressurreição de Jesus?!”, alguém poderia indagar. Bem, esse é o Tomé que convencionalmente nos é apresentado. Porém, esta descrição é, no mínimo, injusta com o apóstolo e desonesta com o relato de João. Ao ler o texto joanino com um pouco mais de atenção, podemos perceber o quanto Tomé se parecia com os demais discípulos, e o quanto somos parecidos com ele.

Tomé era um discípulo leal, mas um tanto pessimista (11.16). Ele, assim como os demais discípulos, ainda experimentava a tristeza da perda de seu Mestre. A diferença era que Tomé era do tipo que preferia ficar sozinho com seus pesares a encontrar o consolo de companhias. Talvez por isso ele estava ausente quando o Senhor aparecera pela primeira vez aos seus companheiros (v. 24). Ademais, Tomé não era daqueles que se deixam persuadir tão facilmente. Quando os outros lhe contaram a boa nova da ressurreição de Jesus, atestada por Sua aparição, ele não pôde acreditar. Talvez, Tomé, de algum modo, estivesse consciente do grande poder da imaginação. Seus amigos poderiam ter sido iludidos pelo desejo de rever o Mestre. Ele sabia do que a imaginação é capaz. Então, responde-lhes com as palavras que lhe renderam seu epitáfio: “Se eu não vir o sinal dos cravos em Suas mãos, e não puser ali o dedo, e não puser a mão no Seu lado, de maneira nenhuma o crerei” (v. 25).

Para surpresa de todos, oito dias após a primeira aparição, no domingo seguinte, o Jesus ressurreto se apresenta novamente aos discípulos – desta vez Tomé estava entre eles. A saudação do Mestre é semelhante à da primeira vez. Porém, agora, Ele tem uma palavra especial a um dos presentes. Ele se dirige a Tomé, e diz: “traz o teu dedo aqui e vê as Minhas mãos; e traz a tua mão e coloca no Meu lado, e não seja incrédulo, mas crente” (v. 27). Tomé, ao ver e ouvir o Mestre, sem dar um passo sequer à frente, exclama: “Senhor meu e Deus meu!” (v. 28).

Quero destacar algumas verdades neste ponto.


Primeiro, a dúvida de Tomé não era maior que a dos outros. Crucificamos Tomé e o malhamos como o “discípulo incrédulo”, assim como crucificamos e malhamos a Pedro como o “discípulo que negou a Jesus”, e prosseguimos em nosso costume de apontar o dedo aos demais servos de Deus que vacilaram e pecaram. Esse costume é, em parte, uma conseqüência da facilidade que o ser humano possui de identificar o pecado no outro a expensas de enxergá-lo onde mais lhe seria benéfico, a saber, nele mesmo. Colocamos uma lupa de aumento sobre o pecado do próximo, ao mesmo tempo em que somos míopes quanto aos nossos próprios pecados.

Perceba que Tomé não foi mais incrédulo que os demais discípulos. Estes acreditaram na ressurreição de Jesus antes de Tomé somente por terem-nO visto primeiro. Se Tomé estivesse com eles naquele primeiro domingo (v. 19, 24), sua dúvida ter-se-ia dissolvida juntamente com a deles. Em um sentido, Tomé foi apenas o porta-voz da incredulidade de todos os discípulos.

Segundo, ao contrário do que se pensa, a fé de Tomé foi além da fé dos demais discípulos. Aproximemo-nos do texto para ver o que aconteceu naquela sala.

Observe que Tomé dissera anteriormente que só acreditaria na ressurreição de Jesus se tocasse o Seu corpo ressurreto (v. 25). Porém, não foi preciso nem mesmo tocar para que sua fé desabrochasse. O que Jesus lhe declarou foi suficiente para lhe revelar que o Mestre estava presente no momento em que Tomé conversava com os outros discípulos, há alguns dias atrás. Mesmo invisível, mesmo que não pudesse ser visto, Ele estava lá! Esta é uma verdade que deve nos trazer ânimo. Jesus sempre está ao lado dos Seus, mesmo quando não acreditamos nEle e duvidamos de Sua fidelidade.

Ao ter seu ceticismo dissipado pela visão e palavras de Jesus, Tomé expressa sua fé em termos mais elevados que a dos demais apóstolos. Ele não somente crê na ressurreição de Cristo, como também O reconhece como Senhor e Deus. Tente perceber o quanto a fé de Tomé excede a dos outros discípulos. Racionalmente, a partir do que ele viu, era possível apenas reconhecer que Jesus ressurgira dentre os mortos. Porém, Tomé enxerga muito além. Ele percebe que Este que ressurgira dentre os mortos não era qualquer um, senão o próprio Deus.

Muitos dos contemporâneos de Jesus O viram, mas tal visão não produzira neles fé. Porém, quando a simples visão física é acompanhada de fé, então esta visão eleva-se a um nível mais profundo. A fé equivale-se à visão que gera vida, ao conhecimento de Deus. Tomé foi um dos que viram, fisicamente, a Jesus e, pela fé, enxergaram-nO em Sua forma real mais profunda, em Sua Divindade.

Sua declaração: “Senhor meu e Deus meu!”, constitui a mais sublime das confissões registradas nos Evangelhos. Ela é o ápice do Evangelho de João e faz ligação com o prólogo: “e o Verbo era Deus”. Desta forma, o evangelista autentica a identidade de Jesus como o Logos encarnado mediante o testemunho do discípulo que, tendo-O visto após a ressurreição, tornou-se um fiel, e não incrédulo.

Terceiro, a despeito da grande fé de Tomé (espero que eu já não seja mal compreendido com esta expressão), há uma bem-aventurança maior endereçada a todos os leitores do Evangelho, hoje. Não podemos mais ver (fisicamente) a Jesus, por isso, hoje, a fé é produzida em nós não pelo que vemos, mas pelo que ouvimos. Como disse Paulo: “De sorte que a fé vem pelo ouvir, e o ouvir pela Palavra de Deus” (Rom. 10.17). Jesus declara que são “bem-aventurados os que não viram, e creram” (v. 29). Pedro declara isto em outras palavras: “embora não O tendes visto, O amais; e embora não O vedes agora, credes nEle e exultais com gozo inefável e cheio de glória, recebendo o fim objetivo da vossa fé, a salvação das vossas almas” (1 Ped. 1.8-9). A fé nos faz contemplar o que não se pode ver.

Bem, fica uma pergunta para reflexão: quanto da incredulidade de Tomé não está em nós?

O evangelicalismo brasileiro tem muitas facetas, e uma delas é a cara de Tomé. Os evangélicos tupiniquins são a cara deste discípulo, mas advirto: apenas pela metade. Pois o discípulo “incrédulo” se mostrou vigoroso em sua fé, logo em seguida. Por outro lado, os evangélicos brasileiros param no ceticismo empírico (porém, realista) da primeira fase de Tomé (v. 25). O que quero dizer é exemplificado pelo empirismo místico que caracteriza nosso povo. Paulo nos diz que a fé vem pelo ouvir. Os místicos evangélicos, porém, já não consideram a Bíblia tão importante para a fé quanto suas experiências sobrenaturais (revelações diretas de Deus, glossolalias, visões, sonhos, êxtases espirituais, etc.). É preciso algo “mais poderoso” que a própria Bíblia para sustentar a fé destes místicos. Bem, eles bem poderiam ser chamados de “Tomés” modernos – céticos empiristas. Só acreditam no que experimentam.

O que eu poderia dizer, se não repetir as palavras do Mestre: Seja crente, e não incrédulo!

Autor : Pr Diego Dy Carlos